Saúde mental de estudantes e professores: desafios e caminhos

21 de novembro de 2022

Quem habita o ambiente escolar pôde perceber um clima diferente no retorno às salas de aula. E quanto tempo as nossas escolas ficaram sem a alegria dos pátios ocupados na hora do intervalo, não é mesmo?

Segundo dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), foro composto por 35 países, o Brasil foi o país que mais tempo manteve as escolas completamente fechadas em 2020. O dado considera somente a Educação Infantil e os anos iniciais do Ensino Fundamental.  No total, foram 178 dias de inatividade. A média das demais nações analisadas foi de 48 dias.

O impacto emocional das perdas familiares, o sentimento de medo e a falta de socialização ao longo do período vêm chamando a atenção de especialistas, que nos alertam para uma segunda onda pandêmica: a da saúde mental.

Tudo isso porque estudantes com crises de ansiedade, aumento dos casos de depressão entre professores e ondas de violência nas escolas são alguns dos desafios recorrentes enfrentados pelas instituições de ensino, na retomada das aulas presenciais.

Entenda.

Saúde mental de estudantes no retorno às aulas

#PraTodosVerem: fotografia colorida de um jovem estudante, sentado na sala de sua casa, com o caderno e um notebook azul aberto sobre uma mesa. Ele usa uma camiseta rosa e está concentrado, fazendo anotações com um lápis amarelo com uma pequena borracha embutida na ponta, que segura com a mão direita.

Os números que jogam luzes a esses novos fenômenos são alarmantes. 70% dos 642 mil estudantes ouvidos em pesquisa recente promovida pelo Instituto Ayrton Senna relataram quadros de depressão ou ansiedade.

33% dizem, hoje, ter dificuldades de se concentrar em sala de aula; outros 18,8% afirmam se sentir “totalmente esgotados e sob pressão”; 18,1% dizem “perder totalmente o sono devido às preocupações” e 13,6% relatam “a perda da confiança em si mesmos”. Além disso, 1/3 dos alunos se autoqualificou como “pouquíssimo focado”.

As preocupações são ainda maiores quando falamos especificamente da chamada Geração Z, nativos digitais nascidos entre 1995 e 2010, grupo que já apresentava índices elevados de ansiedade e depressão antes mesmo da pandemia.

Para ter uma ideia, o suicídio já é a segunda maior causa de mortes de adolescentes do país, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Aí você imagina como anda a…

Saúde mental de professores no retorno à sala de aula

#PraTodosVerem: fotografia colorida mostra uma professora de pé, de costas para nós, que a vemos mas, de frente para uma turma de alunos, adolescentes que estão usando máscaras. Eles estão sentados com uma cadeira de distância entre cada um, seguindo os protocolos de segurança no retorno às aulas presenciais. A professora está vestindo uma camiseta de mangas em tom azul e, por cima, um avental roxo.

Quem está na linha de frente da educação, claro, sente (e absorve!) mais de perto todo esse cenário.

Muito se olhou para os professores durante a pandemia. Nossos super-heróis foram elogiados porque a sociedade, enfim, reconheceu a capacidade de superação desses profissionais diante das adversidades, afinal, eles estiveram ali, presentes, ao longo dos dezesseis, quase dezoito meses em que as escolas mantiveram seus portões fechados. Quase sempre sem o suporte de suas instituições de ensino no rearranjo que os obrigou a dar aulas de casa, do dia para a noite, no improviso.

Só que agora esse time também vem pedindo socorro. Segundo dados da pesquisa Nova Escola, que ouviu 9.557 educadores, 53% dos casos de afastamento do trabalho são por questões relacionadas à saúde mental, fortemente abalada no retorno às atividades escolares.

A classe de trabalhadores ainda enfrenta as angústias, medos e ansiedades causadas por uma pandemia cheia de incertezas, que não se encerra no momento em que as aulas retornam ao formato presencial. Daí os altos índices de burnout desses profissionais.

Qual o plano de ação?

#PraTodosVerem: fotografia colorida mostra a mesma professora da imagem anterior de máscara, mas agora de frente para a lousa da sala de aula. Ela está escrevendo uma equação matemática, com um canetão azul, na mão direita. Com a mão esquerda, segura um caderno

Para a OMS, 90% dos casos mencionados até aqui podem ser evitados a partir de políticas públicas e estratégias voltadas para a saúde mental em diversas esferas sociais porque, embora o diagnóstico e o tratamento estejam relacionados à área da saúde, a sociedade como um todo tem a responsabilidade de promover um ambiente adequado para o desenvolvimento saudável.

Partindo dessa perspectiva, a escola ocupa um papel fundamental, por ser um espaço de construção coletiva de repertório cultural. Daí a importância do trabalho contínuo das competências socioemocionais de alunos e professores.

Mas o que são elas?

As competências socioemocionais são as habilidades relacionadas à nossa capacidade de sentir, pensar e nos comportar. Trabalhar essas competências em sala de aula apoia os estudantes a conhecer os próprios limites e os dos outros, a tomar decisões conscientes e a refletir sobre sentimentos e emoções.

Entenda mais sobre o tema no e-book Competências Socioemocionais: o que são e como podem contribuir para o desenvolvimento dos estudantes”, desenvolvido pela Fundação Telefônica Vivo.

Thais Bozza, pesquisadora da área de Psicologia Educacional pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), avalia que é dentro das instituições de ensino que os jovens vivenciam aspectos importantes de socialização e de expectativas pessoais. Por isso, considera essencial que as instituições de ensino proporcionem ambientes acolhedores e saudáveis, que ofereçam estrutura e apoio para lidar com questões de saúde mental.

“Esse espaço precisa ser não apenas físico, mas também curricular e institucional, para que estudantes e educadores possam refletir sobre essas temáticas, expressando seus sentimentos e emoções, e dialogando abertamente sobre aquilo que os angustia, seus conflitos cotidianos e problemas de convivência”, explica.

Acolhimento de alunos

#PraTodosVerem: fotografia colorida mostra uma turma de alunos, crianças, sentadas em volta de uma mesa com a professora. Todos estão usando máscaras e a professora além da máscara, usa um reforço: um protetor facial de acrílico transparente que cobre todo o rosto. Todos fizeram uma pausa para fazer a foto e estão sorrindo. As crianças têm seus cadernos abertos e seguram um lápis cada uma.

O guia De volta à escola: estratégias para a acolhida pós-isolamento social, do Instituto Ayrton Senna, traz 5 eixos nas ações com foco na manutenção da saúde mental dos estudantes.

1) Restabelecimento da sensação de segurança: considerando a volatilidade do momento atual, e a quantidade de informações recebidas diariamente, algumas delas falsas, restabelecer a sensação de segurança deve ser central, sendo recomendável que se abra espaço para discussões que avaliem a veracidade de informações que nos cercam, estabelecendo o senso de segurança e pertencimento à escola.

2) Restabelecimento da estabilidade: as mudanças de rotina vivenciadas no período pandêmico e as dificuldades de adaptação, além das incertezas (não saber o que vai acontecer no dia seguinte, na semana, se os pais terão emprego, entre outras), pode aumentar a sensação de instabilidade e ansiedade. Nesse cenário, é fundamental a apresentação de uma nova rotina escolar estruturada, que esteja aberta às perguntas e dúvidas dos alunos.

3) Promoção de espaços de escuta: levar os questionamentos sobre a doença para dentro das escolas possibilita criar um espaço para o exercício do pensamento crítico, para a vazão aos sentimentos, o esclarecimento e a escuta aos alunos. Esses espaços podem ser estabelecidos com propostas pontuais sobre a temática. Com os mais novos, recomenda-se trabalhar com produções gráficas sobre o tema.

4) Relação família-escola: como nunca visto antes, escola e família precisaram trabalhar próximas e de maneira sincronizada e engajada. Por que não aproveitar o retorno às aulas e manter essa relação? Este ponto central pede pela manutenção da relação entre esses dois eixos, e isso é possível ao apresentar à família a nova organização escolar e aos cronogramas que serão seguidos, aproveitando sempre para engajá-la e convidá-la a contribuir para essa nova proposta.

5) Relação entre estudantes, professores e profissionais da escola: agora, o ambiente escolar deve propiciar momentos para a promoção da reintegração entre pares e também o restabelecimento da relação professor-aluno. Esse processo pode ser feito de maneira intencional, ao promover mais atividades em grupo ou reservar momentos para que os grupos possam conversar sobre o dia a dia, respeitando as medidas de segurança definidas pelas autoridades para evitar o contágio que ainda poderá acontecer.

Acolhimento de professores

#PraTodosVerem: fotografia colorida mostra duas mulheres de costas caminhando em um local aberto, carregado de árvores. Elas estão conversando, felizes, em um momento que parece ser descontraído do dia. A mulher da direita está usando uma camisa azul, óculos de grau e seus cabelos são cacheados. Ela tem a cabeça ligeiramente voltada para a esquerda, e olha a colega.Já a outra, veste um suéter cinza e seus cabelos são lisos.

O Instituto Península – organização do terceiro setor que trabalha para apoiar a melhoria da carreira docente – destaca quatro eixos de ações com foco na manutenção da saúde mental de professores.

1) Caminhadas de diálogo: a estratégia busca exercitar a qualidade de presença e escuta, a fim de criar conexões. Convida os professores a saírem em caminhadas em dupla, onde cada um tem 10 minutos para falar sobre um tema selecionado pelo coletivo escolar. Enquanto um educador fala, o outro permanece em silêncio, ouvindo.

2) Ambientes de pensamento: metodologia criada para ajudar grupos a incorporarem múltiplas perspectivas sobre um tema em ambientes de reflexão, respeito e apreciação. A estratégia colabora para gerar novas ideias, desabilitar pensamentos limitantes, ampliar possibilidades e fundamentar tomadas de decisão coletivas.

3) Cultura de rituais: destaca a importância de estabelecer ritos que marquem e honrem os momentos vividos – memorial em homenagem às pessoas que adoeceram gravemente ou que perdemos; mural com fotos das pessoas se reinventando e se superando (competências adquiridas), rodas de gratidão, vídeo ou cartas de agradecimento das famílias e alunos aos educadores, dentre outros.

4) Práticas de autocuidado: momentos de pausa das tarefas diárias para que os educadores olhem para si, repensem seus hábitos e encontrem novas maneiras de ser e estar no mundo e de interagir com os estudantes. Podem ser propostos grupos de yoga, artesanato, dança e jardinagem, dentre outros manifestados pelos próprios profissionais.

#PraTodosVerem: fotografia colorida mostra dois jovens estudantes de máscaras, sentados um ao lado do outro em uma. Eles estão se cumprimentando com os cotovelos ao invés das mãos, cumprindo os protocolos de segurança no retorno às aulas presenciais.

Por aqui, nós sabemos que todos os esforços são necessários para que a gente caminhe rumo à construção do ensino que nossas crianças e jovens merecem, mas entendemos que, antes de tudo, as pessoas precisam estar no centro.

Se você que nos lê é professor, mãe, pai ou aluno, conte nos comentários, quais dificuldades vêm sentindo no retorno às aulas presenciais e como acredita que o ambiente escolar pode se tornar mais saudável. Porque a troca de ideias e os espaços de escuta serão fundamentais nessa construção!

Fonte: Dialogando - Saúde mental de estudantes e professores: desafios e caminhos Dialogando

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