Tecnologia na educação: uma análise geral de onde o Brasil está nessa pauta

26 de setembro de 2023

O mundo, de fato, dá voltas, e se há alguns anos gestores e professores viam com resistência o uso da tecnologia na educação, hoje já entenderam que as tecnologias digitais podem desenvolver competências fundamentais para a vida em sociedade e o preparo para o mercado de trabalho.

O problema é que essa pauta já nasceu cercada de desafios. O maior deles é o acesso, afinal, a maior parte dos estudantes das escolas públicas não tem internet nem notebook em casa. A conexão dessa turma acontece quase sempre de um smartphone com um plano de dados restrito. Daí a importância do espaço escolar à frente dessa causa.

Para entender onde estamos e quais devem ser os próximos passos a fim de acelerar as determinações da nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para uma educação engajadora, o estudo Tecnologias Digitais nas escolas municipais do Brasil: cenário e recomendações – fruto de uma parceria entre a Fundação Telefônica Vivo, o Centro de Inovação para a Educação Brasileira (Cieb) e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), com apoio técnico do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) – vem para investigar esse cenário.

Mas antes de descobri-lo, vamos retomar brevemente as diretrizes da BNCC.

Tecnologia na educação – revendo as orientações da BNCC

Dada a urgência do tema, nos últimos anos foram publicados muitos relatórios para apoiar gestores na construção e implementação de políticas públicas para o uso da tecnologia na educação. O principal deles, a BNCC, documento que traz as dez competências gerais da Educação Básica, com atenção especial à quinta, que versa especificamente sobre o uso de tecnologias nos processos de ensino e de aprendizagem, descrevendo as habilidades esperadas dos estudantes:

“Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva” (BNCC).

Mas para que a computação não seja um privilégio, mas um direito de todo aluno, serão necessárias doses cavalares de políticas públicas estruturadas e integradas que garantam:

a) A viabilização de infraestrutura – equipamentos, internet banda larga com velocidade suficiente e distribuição que torne possível o uso pedagógico nas salas de aula e nos diferentes espaços das unidades escolares;

b) Acompanhamento e monitoramento constantes das ações implementadas;

c) Formação das equipes pedagógicas para o uso das tecnologias digitais com intencionalidade pedagógica e de forma integrada ao currículo.

A BNCC reforça que as premissas de computação esperadas em cada etapa de ensino são:

a) Educação Infantil: desenvolvimento e reconhecimento de padrões básicos de objetos;

b) Ensino Fundamental: compreensão da computação e seus modos de explicação de experiências, artefatos e impactos na realidade social, no meio ambiente, na economia, na ciência, nas artes;

c) Ensino Médio: compreensão das potencialidades da computação para resolução de problemas.

Segundo o documento, os alunos precisam desenvolver até o final do Ensino Fundamental:

a) Utilização de ferramentas digitais: precisam ser capazes de usar ferramentas multimídia e periféricos para aprender e produzir;

b) Produção multimídia: utilizar recursos tecnológicos para desenhar, desenvolver, publicar e apresentar produtos (como páginas de web, aplicativos móveis e animações) para demonstrar conhecimentos e resolver problemas;

c) Linguagens de programação: usar linguagens de programação para solucionar problemas. Domínio de algoritmos: compreensão e escrita de algoritmos. Avaliação de vantagens e desvantagens de diferentes algoritmos;

d) Utilização de classes, métodos, funções e parâmetros para dividir e resolver problemas. Visualização e análise de dados: utilização de diferentes representações e abordagens para visualizar e analisar dados;

e) Mundo digital: compreensão do impacto das tecnologias na vida das pessoas e na sociedade, incluindo nas relações sociais, culturais e comerciais;

f) Uso ético: utilização das tecnologias, mídias e dispositivos de comunicação modernos de forma ética, comparando comportamentos adequados e inadequados.

Tecnologias Digitais nas escolas municipais do Brasil: cenário e recomendações

Para entender quais os avanços e gargalos das escolas do país no processo de aplicação das normas da BNCC, o estudo teve como principal objetivo identificar como o ensino de Tecnologia e Computação está presente nos currículos das redes municipais e quais são as estruturas de apoio, em especial técnico e pedagógico, oferecidas pelas secretarias de Educação para que tudo isso, na prática, aconteça.

A pesquisa foi desenvolvida em duas etapas:

1. Uma quantitativa, que envolveu a aplicação de questionário às redes de ensino – foi considerada uma amostra de 1.065 redes, representativas das 5.568 existentes no País; 2. Outra qualitativa, que englobou entrevistas com profissionais das secretarias de Educação e visitas a municípios para conhecer as estruturas das escolas e das secretarias de Educação.

Vamos ao levantamento!

A tecnologia na educação em números

Os dados do mapeamento quantitativo indicam que, embora desde 2018 a BNCC traga a obrigatoriedade de trabalhar a cultura digital no Ensino Básico, um número expressivo de redes de ensino ainda não atualizou ou desenvolveu currículos que englobam o estudo de Tecnologia e Computação: na Educação Infantil, são 37% (chegando a 44% na Região Sul); e nas capitais são 20%, conforme indica o gráfico 1.

#PraTodosVerem: gráfico mostra como o currículo da Educação Infantil vem tratando o ensino de Tecnologia e Computação nas redes municipais.

Por “transversal” considera-se a definição presente na própria BNCC: “Aquilo que atravessa. (…) são aqueles assuntos que não pertencem a uma área do conhecimento em particular, mas que atravessam todas elas (BRASIL, 2019)”.

A Base prevê que o uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC) seja feito “tanto de forma transversal – presente em todas as áreas do conhecimento e destacadas em diversas competências e habilidades com objetos de aprendizagem variados – quanto de forma direcionada, tendo como fim o desenvolvimento de competências relacionadas ao próprio uso das tecnologias, recursos e linguagens digitais”.

Os dados coletados acima chamam atenção para o grande percentual de municípios cujos currículos da Educação Infantil ainda não englobam o ensino de tecnologias, em proporção maior fora das capitais. Nesse cenário, fica clara a necessidade de um suporte maior do MEC e das redes estaduais para que essa implementação curricular ocorra já nessa etapa, com foco nos municípios fora das capitais.

Ensino Fundamental

Tanto nos anos iniciais quanto nos finais do Ensino Fundamental, há predomínio do ensino de Tecnologia e Computação de maneira transversal no currículo (42% no cenário nacional).

Nos anos iniciais, em segundo lugar, a opção mais citada é “o currículo não engloba o ensino de Tecnologia e Computação”, com 21%, como aponta o gráfico abaixo. Na sequência, aparecem o ensino de Tecnologia “como competência e/ou habilidades em alguns componentes curriculares” (17%) e “como competência e/ou habilidades em todos os componentes curriculares” (11%).

Nas secretarias municipais localizadas em capitais, especificamente, mais da metade (52%) afirma que o ensino aparece de maneira transversal, enquanto somente uma alegou que “não engloba o ensino de Tecnologia e Computação”.

#PraTodosVerem: gráfico mostra como o ensino em Tecnologia e Computação aparece no currículo nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Nos anos finais, há pequena variação de 2 pontos percentuais quanto aos anos iniciais – 19% afirmam que o ensino de Tecnologia aparece “como competência e/ou habilidades em alguns componentes curriculares”, enquanto 17% alegam que “não engloba o ensino de Tecnologia e Computação”. No eixo das capitais, todas declaram que seus currículos englobam o ensino de Tecnologia, sendo “de maneira transversal” a opção mais recorrente (54%).

#PraTodosVerem: gráfico mostra a aplicação do ensino de Tecnologia e Computação no currículo escolar das redes municipais.

Um ponto de atenção em relação aos resultados traz o fator da transversalidade do ensino, a modalidade mais citada nas duas etapas de ensino estudadas (Educação Infantil e Ensino Fundamental).

Embora exista um alto percentual de redes indicando que o aprendizado de Tecnologia e Computação acontece de forma transversal, a pesquisa qualitativa mostrou que em algumas delas parece não existir uma estratégia nesse sentido. Fator demonstrado em uma das localidades quando os pesquisadores perceberam o uso equivocado do termo, a partir do depoimento de um secretário de Educação que disse: “aparece de forma transversal, de acordo com a necessidade da rede ou de acordo com a necessidade do professor”.

Nesse caso, a hipótese é de que não exista o desenvolvimento de competências e habilidades relacionadas às tecnologias digitais de forma integrada e intencional ao currículo, uma vez que a transversalidade não se dá segundo “a necessidade do professor” – a ideia é que a temática passe por todas as disciplinas.

Estruturas de apoio para o uso de tecnologias digitais nas escolas

O estudo investigou as estruturas de apoio das secretarias de Educação que podem estar relacionadas a uma implementação mais qualificada de tecnologias nas escolas. Nesse cenário, o levantamento entrega se há equipes focadas nessa área.

#PraTodosVerem: gráfico mostra se há áreas específicas nas redes de ensino dedicadas ao planejamento e implementação de tecnologias digitais.

As análises por nível socioeconômico (NSE) e por Ideb das redes de ensino não trazem diferenças significativas: entre os municípios de NSE mais baixo, 72% declaram não contar com equipes específicas, enquanto entre os de NSE mais alto, 70%. Mas quando consideradas somente as capitais, o total de redes sem uma área específica para o desenvolvimento de ações na área cai para 11% — e essas secretarias afirmam que existem profissionais em outros departamentos da prefeitura que atuam para assegurar a implementação de tecnologias digitais nas escolas.

Formação de professores

O número de profissionais que ainda não se sentem seguros ou apropriados das ferramentas e recursos disponíveis para inserir tecnologias digitais de forma qualificada nos processos de ensino ainda é bem expressivo.

Os questionários do último Saeb (Sistema de avaliação da Educação Básica), respondidos por quase 200 mil professores, revelaram que 12% deles se sentiam “pouco preparados” para usar novas tecnologias de informação e comunicação na prática pedagógica; 52% se diziam “razoavelmente preparados” e apenas 36%, “muito preparados”.

94% dos profissionais brasileiros consideraram o uso de tecnologias como muito ou extremamente importante para o aprendizado, mas a maioria deles se autoavaliou, em média, com baixo nível de apropriação no uso dos recursos, portanto as ferramentas digitais não são utilizadas como suporte à prática pedagógica, ou são utilizadas sem explorar o seu potencial.

Entre os principais alertas, um índice se mostra bastante preocupante – 39% das redes municipais responderam que não há formação continuada para os professores dentro das disciplinas de tecnologias digitais. Nas regiões Sudeste e Nordeste, o percentual de redes que não ofertam formação na temática chega a 44%, como mostra o gráfico a seguir.

#PraTodosVerem: gráfico mostra a existência de formação continuada para as temáticas de tecnologia digitais para os professores.

Em relação à oferta de formação continuada, o levantamento revela desigualdade significativa entre as redes municipais, já que todas as capitais brasileiras declararam oferecer formações, das quais 78% (21) afirmaram que as iniciativas são conduzidas por uma equipe da própria secretaria municipal de Educação.

#PraTodosVerem: fotografia colorida de uma estudante sorridente usando um computador dentro de uma biblioteca escolar.

O mapeamento completo ainda traz dados divididos por tersil, nível socioeconômico e muito mais! Confira o mapeamento completo do levantamento no link.

Fonte: Dialogando - Tecnologia na educação: uma análise geral de onde o Brasil está nessa pauta Dialogando

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