“Existem dois tipos de conhecimento. Ou sabemos sobre o assunto ou sabemos onde encontrar informação sobre ele”
Samuel Johnson, filósofo inglês (1709-1784)
O ser humano tem uma característica curiosa. Inventa coisas mais avançadas do que ele mesmo é capaz de entender e lidar. Inventou, por exemplo, o automóvel, e demorou um bom tempo para criar a autoescola, a carteira de motorista e as demais regras para o uso da nova máquina pelas ruas. O mesmo acontece hoje com o avassalador avanço da tecnologia em todos os aspectos da vida. Recursos são criados a cada dia, eles vão mudando o dia a dia, mas o resto patina sem andar lado a lado com esses avanços. A educação é um bom exemplo.
A lousa foi trocada por projetores, o giz pelo mouse – mas isso é o mesmo que houve com um invento chamado televisão, que, durante muito tempo, foi apenas o rádio com imagens. O ser humano não sabia o que fazer com o que havia criado. A tecnologia, na verdade, não transformou apenas as ferramentas de um mesmo conteúdo. Ela está mudando a própria forma com que os seres humanos se relacionam com os outros, consigo mesmo e com a vida. É por isso que estudiosos e pesquisadores no mundo todo estão debruçados em estudar e desenvolver as competências necessárias para que o mundo avance no século 21.
“Tenho sérias dúvidas sobre a sobrevivências nos próximos 10, 15 anos, do modelo tradicional de ensino professor-aluno”, disse Richard Elmore, professor da Faculdade de Educação da Universidade Harvard, à revista americana de tecnologia Wired. No lugar desse modelo, acredita ele, virá um modo de aprendizado baseado na tecnologia que a criança acesse múltiplos recursos, conduzida por sua própria curiosidade e ritmo. A falta de um professor dizendo o que o aluno tem que aprender – e cobrando dele isso, por meio de tarefas e provas – causa urticária em muitos educadores, convictos da sua importância indispensável.
Elmore discorda. Para ele, os educadores tendem a subestimar a capacidade das crianças de controlar seu próprio processo de aprendizagem. E subestimam porque acham que aprender continua sendo memorizar, quando na verdade trata-se de acessar e analisar uma imensa riqueza de informações disponíveis ao alcance de um dedo. “A grande questão é se queremos desenvolver uma geração de pessoas com domínio de sua própria capacidade de aprender ou se queremos perpetuar nossa obsessão em treinar pessoas a reproduzir a partir da memória aquilo que a atual geração de adultos acha que eles devem saber.”
O professor Elmore, a bem da verdade, repercute o que o filósofo Samuel Johnson disse há quase 250 anos. Se já valiam na época, quando tudo o que havia eram bibliotecas, valem ainda mais hoje. As competências para o século 21 passam obrigatoriamente pela capacidade de lidar sozinho, sem mediação, com a avalanche de informações que serpenteiam num rio chamado internet. Mas essa é só uma parte do caminho. Não basta, neste admirável mundo novo, apenas saber lidar sozinho com o conhecimento. Se o professor tradicional perde importância, surge no seu lugar algo mais desafiador. O National Research Council, uma instituição americana dedicada a fazer pesquisas que ajudam governos a criar políticas públicas, propôs as competências para o século 21 em três grandes campos.
O primeiro, chamado de cognitivo, é o mais óbvio e esperado. Ele se refere à capacidade da pessoa de aprender e memorizar conhecimentos e é a base do ensino tradicional. A situação fica mais complicada – e requer muitas pesquisas ainda – com o segundo campo, batizado de intrapessoal, que se refere à capacidade do estudante de lidar com suas emoções, como frustrações e determinação para atingir um objetivo. Talvez a mais complexa competência de todas seja a interpessoal, que envolve a habilidade de se relacionar com os outros, de interagir com ideias diferentes e tirar conclusões positivas delas, com respeito à opinião alheia. O ser humano, basta pensar na vida diária, não é muito bom nisso, de tão bem ensinado que é a ser individualista. Quem sabe seja por isso que o professor tenha sido tão indispensável até hoje – e que os melhores não sejam os que melhor ensinam, mas os que mais motivam.